São muitos os exemplos de empresas bem sucedidas que recorreram a capital de risco. Casos de sucesso para copiar.
Aos 50 anos, José Carlos Lopes, professor de engenharia química, decidiu tornar-se empresário. "É preciso ser louco", diz, sem se arrepender da mudança que iniciou em Outubro de 2005, quando constituiu a Fluidinova. A ideia foi o resultado dos 10 anos passados nos Estados Unidos, entre a vida académica e o trabalho na indústria de exploração de petróleo, e da investigação desenvolvida no Laboratório de Processos de Separação e Reacção da Faculdade de Engenharia e Universidade do Porto (FEUP). Um percurso que deu a experiência necessária para perceber que entre os projectos de I&D (Inovação e Desenvolvimento) desenvolvidos havia alguns com potencial de mercado. Hoje, o 'spin-off' da faculdade está a criar um composto químico que permite reconstituir o osso humano, entre várias outras inovações ligadas à sua área de actividade: a engenharia de fluídos.
José Lopes e a Fluidinova são ainda uma excepção no quadro da criação de empresas em Portugal. A média anual de 30 mil novas sociedades, desde 2000, está abaixo dos padrões da OCDE, segundo o 'The Global Entrepreneurship Monitor 2004 Portugal". O empreendedorismo revela promotores com qualificações até ao nível do secundário (mais de metade) e ambições limitadas ao mercado mais próximo. A falta de apetência pelo risco é outro dos factores que explicam a fraca aposta em novas ideias.
Os primeiros passos
Em nome da competitividade da economia europeia e da Agenda de Lisboa, o Governo quer qualificar o empreendedorismo nacional e aí, sim, a Fluidinova é um dos bons exemplos. José Lopes reconhece que nos últimos dois anos foram criados os instrumentos necessários para democratizar o acesso ao capital, típico dos mercados mais desenvolvidos, como o norte-americano. "Falta intensificar o esforço, sobretudo na formação". O resto do trabalho está a cargo dos promotores. A estes recomenda particular atenção à elaboração do plano de negócios. "É fundamental, porque para ter viabilidade a ideia tem de haver mercado". No caso da Fluidinova, a participação num concurso do IAPMEI garantiu o apoio nesta área, que foi depois reforçado com a entrada de uma entidade com competências de gestão no capital social. "Dá credibilidade ao negócio", explica o empreendedor.
Garantir o capital de risco
Estavam assim cumpridas duas condições básicas para entrar no radar dos investidores de capital de risco. "A equipa é talvez o mais importante. Tem de haver complementaridade de competências. Têm de ser as pessoas certas para aquele projecto. Depois, o plano de negócios tem de ser bem estruturado. Facilita a análise e acaba por mostrar que a equipa está preparada", confirma fonte do Banif Capital, sociedade de capital de risco do banco de Horácio Roque.
O nível de compromisso dos promotores é outro dos itens na grelha de análise dos investidores, segundo a responsável do Banif. "Temos em conta a dedicação ao projecto e o interesse na valorização da empresa, por contraste com os promotores que querem um bom ordenado ou bons carros". Já Roberto Branco, da Beta Capital, sociedade de investimento vocacionado para os projectos em fase de arranque, destaca as características pessoais dos empreendedores. "A capacidade de resistir às dificuldades e a capacidade de liderança".
Mas nada de enganos. Uma boa equipa e um bom plano de negócios ajudam, mas a base é o produto ou serviço. "Quando se cria um negócio é essencial que se perspective uma forte propriedade intelectual, que seja um projecto realmente inovador, que se dê algo exclusivo ao mercado", explica Pedro de Noronha Pissarra, fundador da Biotecnol, empresa que desenvolve tratamentos para doenças oncológicas.
Alargar os mercado-alvo
Há ainda uma outra regra de ouro para os candidatos a empreendedores. "O mercado português é minúsculo", diz Paulo Rosado, CEO da Outsystems, que desenvolve ferramentas para organizar os departamentos informáticos das empresas. E isso implica "não só internacionalizar o negócio, mas também procurar os recursos necessários para isso", como explica Nuno Arantes-Oliveira, lembrando que a Alfama, empresa que criou para investigar doenças inflamatórias, sofreu uma reestruturação, em 2005, que implicou a criação de uma 'holding' americana, de forma a conseguir atrair investimento estrangeiro.
Além de pensar global é preciso agir rápido, porque o ciclo de substituição de processos e produtos é cada vez mais curto. "Na química, ronda os três anos, quando ainda há pouco tempo andava nos 15 anos", afirma o presidente da Fluidinova. A reacção rápida para aproveitar a oportunidade exige recursos adequados, designadamente financeiros. "O plano de financiamento deve ser feito, no mínimo, a três anos", adianta Pedro de Noronha Pissarra, uma vez que este tipo de projectos carece de um financiamento continuado e de capital intensivo, conseguido, muitas vezes, só através de consórcios de investidores.
Neste sentido, as empresas recorrem, por vezes, a parcerias, mas os especialistas avisam: esta não é uma boa estratégia no início da actividade porque, apesar de dividir o risco, diminuem também o retorno e o próprio valor do negócio no futuro", afirma Nuno Arantes-Oliveira.
Mas não se pense que apenas as empresas tecnológicas são suficientemente inovadoras para atrair investidores. A Beta Capital investiu recentemente numa empresa de embalagens em atmosfera modificada para pescado e o Banif Capital na Sea Road, uma transportadora marítima que faz entregas porta-a-porta.
Casos de sucesso com capital de risco
Fluidinova
Tem pouco mais de um ano de existência. Dedica-se à engenharia de fluidos ou seja aos processos de controlo da circulação da água e ar. Liderada por José Carlos Lopes, a empresa nasceu com 85 mil euros a partir da investigação desenvolvida num dos laboratórios da Faculdade de Engenharia do Porto (FEUP). Emprega 12 pessoas, metade das quais doutoradas. Conseguiu recentemente angariar 1,2 milhões de euros junto da Change Partners e da FEUP. Facturou 150 mil euros este ano e só atingirá o 'break-even' em 2008.
Alfama
Actualmente sedeada em Massachussets e com 18 efectivos, a Alfama foi criada, em 2002, com o objectivo de investigar novos medicamentos anti-inflamatórios. A empresa iniciou a sua actividade com 400 mil euros e através de uma parceria com a farmacêutica suíça Serono, além de alguns apoios governamentais. Mas, em 2005, foi reestruturada com a criação de uma 'holding' americana que a adquiriu. Nesta altura, conseguiu angariou 3,4 milhões de euros, através da PME Investimentos.
Biotecnol
Fundada há dez anos com dois mil euros, angariados através de amigos e familiares, a Biotecnol factura hoje cerca de um milhão de euros anuais. O fundador, Pedro de Noronha Pissarra, apostou no desenvolvimento de medicamentos para doenças do foro oncológico, mas também na consultoria a farmacêuticas de todo o mundo. Actualmente, a Biotecnol emprega 20 pessoas, tem um capital de seis milhões de euros e prevê a abertura de um escritório no EUA, que ficará encarregue da consultoria.
Outsystems
A operar actualmente em Espanha, Holanda, Reino Unido e Estados Unidos da América, além de Portugal, a Outsystems foi criada em Portugal com um milhão de euros, através da NeSBIC. A empresa surgiu da ideia dos fundadores em desenvolver 'software' que permita a outras empresas agilizar os seus departamentos informáticos. No ano passado, a Outsystems viu o seu capital ser aumentado em 2,2 milhões de euros, através da PME Investimentos. A empresa tem 80 trabalhadores.
Gilda Sousa e Joana Moura