A esta nossa peculiar idiossincrasia, junta-se outra que consiste na facilidade com que apresentamos defeitos da nação a um estrangeiro, ao mesmo tempo que nos zangamos seriamente se um estrangeiro apontar esses mesmos defeitos ao nosso querido Portugal.
Mas, independentemente destas nossas engraçadas manias, ao vermos (abaixo) o gráfico elaborado por Vítor Bento, após as últimas eleições legislativas, é difícil não ficarmos de “alma partida”. Portugal apresenta-se hoje irreformável, um país onde quaisquer reformas se tornam muito difíceis se não mesmo quase impossíveis, pois dificilmente um partido chega ao Governo prometendo-as e, lá chegado, poucas hipóteses terá de se manter se as realizar. Os interesses do país são cada vez menos coincidentes com os interesses dos partidos, e a história recente tem-nos mostrado que não tem sido o país a vencer esta dissonância. Cada vez mais dependentes do Orçamento do Estado, e consequentemente de decisões políticas, o status quo é protegido.
Não fosse esta situação de per si grave o suficiente acresce que, para além das consequências das grandes crises que o país viveu e vive, com a pandemia e posterior invasão da Ucrânia, a dívida pública já antes elevadíssima é agora descomunal. E, não fosse isto desgraça suficiente, vivemos um dos maiores invernos demográficos, a que se junta a continua saída de jovens altamente qualificados para países onde são mais considerados, e muito melhor remunerados.
Num país sobre esta pressão, “atacado por todos os lados”, tenderíamos a pensar que pelo menos as políticas concebidas e implementadas contribuiriam para combater as causas deste triste estado a que chegamos. Políticas liberalizadoras na educação, focando-a no interesse dos alunos, para que o elevador social funcionasse. Políticas na área da saúde que potenciassem o acesso do maior número de doentes aos melhores cuidados disponíveis, independentemente dos mesmo serem prestados pelo sistema `público, público-privado ou privado de saúde. Políticas que terminassem com a protecção a muitas das Ordens Profissionais, cuja existência não tem outra justificação que não seja a de, por “alvará publico”, proteger incumbentes em prejuízo de jovens inovadores.
Num mundo onde impera a transformação tecnológica e a digitalização, políticas que realmente descentralizassem os serviços do Estado, e que essa descentralização não significasse muitas das vezes a manutenção ou mesmo o aumento de funcionários públicos. Políticas que deixassem para o mercado a resolução, ou não, dos problemas de empresas inviáveis, há muito sem presente nem futuro, como é caso maior a TAP, cuja nacionalização será paga pelas gerações presentes e futuras. Políticas que baixassem impostos para quem produz riqueza, as empresas a operar em ambiente concorrencial, e tantas outras políticas que não visassem a protecção de determinadas entidades, classes ou pessoas, mas sim o crescimento do pais e a melhoria de vida dos portugueses.
Sendo Portugal um país relativamente pobre, era razoável esperar-se que trabalhasse afincadamente para se tornar rico, e assim poder, como outros o fizeram e fazem, usufruir de forma justa da riqueza criada. Infelizmente, vemos um país com rendimentos de pobre a gastar como se rico fosse. É todo “um mundo de pernas para o ar”.
Ora, só uma fé algo irracional nos permite crer num futuro melhor para o país e para os nossos filhos, a quem vimos deixando em herança um fardo insustentável. Mas, sendo difícil a realidade descrita, e por vezes parecendo sem solução, não podemos desistir. Em especial não podemos permitir aos nossos filhos desistirem. O ser humano já várias vezes demonstrou, em Portugal e pelo mundo, que consegue realizar o impossível. Não será a nossa geração a fazê-lo, mas compete-nos manter o optimismo e transmiti-lo às novas gerações. Vale a pena explicar-lhes o porquê de sociedades mais liberais serem mais ricas, mais inclusivas e mais felizes e, porque mais ricas, protegerem melhor os seus cidadãos mais desfavorecidos, em especial em momentos de privação.
A situação de Portugal é má, sem dúvida, mas é fundamental que os jovens creiam que têm solução. Outros países, partindo de situações similares ou piores conseguiram crescer e melhorar significativamente a vida dos seus cidadãos. Portugal também o conseguirá, haja gente capaz de nisso acreditar, e disponível para trabalhar na mudança que se impõe.
Nota: Este artigo segue a antiga ortografia por vontade expressa do seu autor.